O RITO BRASILEIRO POR FERNANDO DE FARIA
Sim, o Rito ainda não se consolidou tanto em aspectos ritualísticos, de moda
especial, como em aspectos doutrinários, de modo geral. Sem perceber, vamos nos
desta geração pós Candinho (Candido Ferreira de Almeida, o Grande Primaz que
antecedeu a Nei Inocêncio), vamos nos realizando uma historia espontânea, em
que completamos e, de certo modo, modificamos, atualizando, a doutrina
monumental construída por Álvaro Palmeira.
Coube a Álvaro Palmeira o papel de ter reformulado a doutrina do Rito em
1968, destarte, e por outras providencias, passando a historia como o
reimplantador vitorioso. Dr. Álvaro instituiu a doutrina atual ao escrever, naquele
1967/1968, todos os rituais do Rito, ademais de sua Constituição, Regulamento e
tantos outros documentos que ainda aguardam estudos mais profundos e
divulgação. Um monumento doutrinal completo. Porem, pela própria dinâmica da
cultura brasileira, o Rito vem sofrendo transformações, não só em sua ritualística
propriamente dita, mas, de modo mais significativo, em seus fundamentos
doutrinários.
A própria Palmeira, em 1968, trazia-nos coisas novas. Nada, apos Palmeira,
pode se comparar aos velhos temas pioneiramente abordados por Jose Firmo
Xavier em Pernambuco no século passado. Nenhuma semelhança doutrinaria . só o
nome: Rito Brasileiro. Jose Firmo, na realidade, assumira idéias que não poderiam
prosperar, haja vista a dedicação (ao Papa e ao Imperador), a vitaliciedade da chefia
instituída por Firmo o seu próprio favor, a exclusiva filiação de brasileiros . fator
este que, ca entre nos, e também ferido por quem envereda pelo conceito de um
rito patriótico (este um atributo, patriotismo, que, sem muita reflexão, ainda hoje,
pretendem conferir ao Rito . parece-me um erro).
OBICES A EXPANSAO
Embora a ausência de documentos comprobatórios, o dito patriotismo teria
sido também, um dos óbices a época de 1914, quando o Rito foi instituído no GOB por
Lauro Sodré e seus companheiros. Tirava-nos a necessária universidade, impedindo a
expansão. Bem verdades, como em parte ao Rito de Firmo Xavier, na criação de Lauro
Sodré faltavam outros elementos. Por exemplos: rituais (que permitissem a pratica
regular e uniforme do Rito), um estatuto ou constituição (que lhe fixasse os elementos
doutrinários fundamentais) e uma Oficina Chefe, hoje o Supremo Conclave (que
zelasse pelos arcanos do Rito). Não importa que, em documentos iniciais (assim no
Decreto no 500, de Lauro Sodré, 23 de Dezembro de 1914, e na Resolução
determinada pelo Decreto no 554, de Veríssimo da Costa, 13 de junho de 1917) haja
referencias a uma Constituição do Rito que conteria declaração de princípios,
estatutos, regulamentos, rituais e demais institutos . isso parece não ser fidedigno.
Tudo indica que se mencionava o que de fato não existia ainda ou, se existisse, não
teria a necessária divulgação.
Em 1940, Otaviano Bastos e seus companheiros, entre eles Palmeira,
tentariam corrigir estas deficiências, instituindo a Oficina Chefe, solenemente
instalando o Supremo Conclave do Brasil a 17 de fevereiro de 1941, conforme Ato
de no 1671, do Grão Mestre Rodrigues Neves, de 3 agosto de 1940 (nomeando sete
Irmãos para formarem o núcleo inicial), complementado pelo Ato de no 1636, de 6
de fevereiro de 1941, do mesmo Grão Mestre, designando comissão
regularizadora. Este Conclave adormeceria logo a seguir. Voltaria apenas em 1968,
reavivando por Palmeira, já Grão Mestre, pelo celebre Decreto no 2080, de 19 de
marco daquele ano.
Em 1940 seria divulgada uma Constituição, cuja existência Otaviano Bastos
diria ser de 1914. Viriam, também (1940), os primeiros esboços de rituais. E tudo
ali, em 1940, era patriótico: a aclamação (Ciência, Razão, Brasil), a palavra de passe
(Brasil), a decoração verde amarelo dos templos (paredes, altares, dossel), a
exigência de ser de preferência brasileira.
Em grandes linhas a decoração patriótica, inclusive dos aventais, e mantida
ate hoje (1999) por nossos Irmãos sob jurisdição do Supremo Conclave Autônomo .
sede em Cataguases, Minas Gerais, onde foi instalado, na Loja Labor e Civismo a 10
de fevereiro de 1974, e se desenvolveu sob a liderança do professor Lysis Brandão
da Rocha, um dos vultos maçônicos que mais prezo e admiro pelas lições pessoais
extraordinárias que me transmitiu. Presto Homenagem. Pois bem, Palmeira
conhecia esses óbices. Tanto que, no mencionado Decreto 2.080/68, seria explicito
em afirmar o fracasso dos movimentos anteriores a 1968, atribuindo-o a falta de
Rituais completos e ausência de governos no Filosofismo do Rito (sic), bem como a
falta da necessária universidade. Segundo o Decreto, caberia ao Supremo Conclave,
então reimplantado, a missão de colocar o Rito rigorosamente acorde as
exigências maçônicas de Regularidade internacional, fazê-lo de âmbito universal,
separar o Simbolismo do Filosofismo (sic) e constituí-lo em real veiculo de
renovação da Ordem, conciliando a Tradição com a Evolução.
O APELO DE UM SECULO
Todos conhecem o dito Apelo de um Século . lançado em 1864 por Antonio
Miguel Dias, sob o pseudônimo de um Cavaleiro Rosa Cruz, em sua obra clássica
Biblioteca Maçônica ou instrução Completa do Franco Maçom, só seria atendido
(segundo Palmeira) apenas em 1968 com a reimplantação do Rito Brasileiro . o Apelo
pedido por um Rito novo e independente (grifos do próprio autor) que, tendo por
base os Graus Simbólicos e comuns a todos os Ritos, tenha, contudo os altos Graus
Misteriosos diferentes e nacionais. Constitui se na idéia fundamental do Rito
Brasileiro.
Palmeira, sem duvida amenizando a idéia de patriotismo (que pode ser
encontrada no Apelo), explicaria com clareza que o autor, Quando se referiu aos
Altos Graus e diferentes e nacionais, não estava, evidentemente, pretendendo criar
uma Maçonaria nacional, o que seria uma negação da Ordem Universal, tanto que
encareceu fossem os Graus Simbólicos do novo Rito comuns a todos os Ritos. E é
nesse ponto precisamente que se resguarda a unidade doutrinaria da Ordem.
Presente a idéia de o Rito Brasileiro ser o rito dos brasileiros, não por
questões patrióticas, ou de ufanismo, mas sim pelo aspecto pratico de permitir que
os brasileiros tenham o nosso próprio rito, praticando Maçonaria segundo a nossa
própria maneira ou cultura.
Sim, a palavra chave não e patriotismo, e cultura . a grosso conceito, o modo
como cada povo resolve as suas necessidades mais essenciais . como conversa,
prepara seus alimentos, veste se, ama, honra a Deus, educa os filhos, relaciona-se
com seu próximo. O jeitão do brasileiro, o nosso modo de fazer maçonaria.
Trata-se de cultura brasileira. O Rito, sendo nosso e apenas nosso, não
depende da opinião ou de valores que nos sejam trazidos do exterior. Podemos
adotá-los (opiniões e valores), mas não compulsoriamente. Palmeira da a chave:
"conciliar Tradição e Evolução. Nesta geração podemos dizer: conciliar o Universal
ai Nacional. Ou na própria palavra de Palmeira: ... manter fidelidade a universal
Tradição maçônica do Simbolismo, mas os Altos Graus serem formulados sob a
influencia do meio histórico e geográfico da Pátria em que se vive, sob a sua índole,
inspiração e pendores".
A COR DO RITO
Este um bom tema para exemplo da tese, segundo a qual, conforme a cultura
brasileira, esta geração vai modificar a doutrina. O Rito era verde amarelo, patriótico.
Assim documentos que nos foram deixados por Otaviano Bastos e a reminiscência
sustentada sob jurisdição do Supremo Conclave Autônomo. Contudo pensamos,
pensamos e, de repente, sem que tenha havido nada de intencional, passamos a
discutir no Supremo Conclave, qual seria a Cor do Rito. E veio a idéia: e violeta.
Sustentada por inumeráveis razoes e justificativas de ordem mística ou
simbólica, não cabe aqui discutir. O certo e que realizamos uma aspiração nossa, de
nossa própria gente.
Soberanamente discutindo o assunto no Supremo Conclave do Brasil,
concluímos por dizer: a Cor do Rito e violeta. E não houve razoes patrióticas.
Predominou apenas a jeitão brasileiro. Nosso fervor místico, nosso romantismo,
sabe lá. Predominou o misticismo.
Outros Ritos por certo não poderiam fazer adoção tão radical, eis submetido
a fatores históricos e organismos inteiramente exteriores, sem qualquer
possibilidade de serem influenciados pela cultura brasileira. Haja vista, por
exemplo, a interessante discussão em torno da cor com que devem ser decorados
os templos do Rito Escocês Antigo Livre e Aceito.
E da cor violeta . Cor do Rito . viria a adoção do uso da gravata colorida.
Ainda indefinida: qualquer coisa em torno do vermelho. E difícil um padrão violeta,
O violeta puro não deu um esperado gosto estético para cor de gravata. São muitos
os problemas, mas vamos nos orgulhosamente ostentando as novas gravatas do
Rito, reforçando o espírito de corpo (ou de porco, diriam críticos contundentes, que
sempre existem).
Perceber que, na realidade, ao se adotar o violeta como Cor do Rito, nesta
adoção ha todo um formulação doutrinaria, infinita na medida em que sao infinitas
as interpretações simbólicas quanto a esta cor.
CONFLITOS A CONCILIAR
Outros temas doutrinários possuíram, gerando modificações paulatinas, quase
imperceptíveis da doutrina. Por exemplo, esse tópico, misticismo. Pouco discutido,
ainda.
O Rito é teista. Assim a definição inicial imposta por Palmeira nos
documentos que redigiu em 1967/68: rituais, Constituição, Regulamento do Rito,
outros. Em 1992, a Convenção Nacional realizada no Rio de Janeiro discutiu e
aprovou quase por unanimidade: o Rito e Teista. Houve votos contrários.
Dignamente entendiam que a relação do homem com Deus e assunto intimo, nao
devemos integrar o quatro das confissões obrigatórias que um Obreiro deve fazer
para filiar-se a determinado corpo maçônico. Tudo bem. O certo e que
confirmamos esta geração: o Rito e teista. Significa: afirmação da existência de
Deus, da possibilidade de Deus revelar se (Revelação Divina), de Deus interferir em
nossas vidas (Providencia Divina).
Teistas. Cabe-nos assim combater a superstição. Contudo ha elementos
delicados que se aproximam quase sem serem notadas, as vezes constituindo-se
em grosseira superstição, ou idolatria, as vezes legitima manifestação de forcas
místicas interiores. Um tema difícil, entregue aos cuidados dessa nossa geração:
conciliar a Razão com a Fe.
UM EXEMPLO, MUITO DELICADO:
O RITUAL DO GRAU33
Dr. Palmeira, em 1968, dando estrutura ao Rito escreveu todos os nossos
rituais, simbólicos e filosóficos. Menos o do Grau 33, deixando-nos copia servil do
adotado no Rito Escocês Antigo e Aceita aqui no Brasil.
Pois bem, valendo outra vez as aspirações mais legitimas, procurou-se, no
Supremo Conclave, adotar ritual próprio. E um novo ritual foi aprovado e vem
sendo praticado nesta década de 90. De conteúdo fortemente místico, tem
merecido criticas leais, embora adesão sem restrições e muito satisfatórias. Vamos
vivendo. Uma fase nova, plena de elementos que nos mesmos adotamos sem dever
explicações a nenhum órgão estrangeiro, sem esquecer, contudo, que devemos
conciliar a Razão com a Fe. Devagar, sem conflitos. O exato ponto de equilíbrio. O
modo brasileiro de um homem relacionar-se a Deus.
O QUE SIMOES TEM A VER COM TUDO ISSO
Pensara o leitor que me esqueci do Posfacio. Nada disso. Tudo aqui foi escrito
para dizer: Simões e um fazedor de idéias. Normalmente anda a frente e não tenho
constrangimento na confissão publica . e um dos Irmãos que me põem a pensar e,
mesmo contrariado de inicio, no fim acabo concordando com o Simões, tal a
profundidade e correção de seu pensamento.
Cabe registro histórico. Coube ao Simões a idéia original de adotar a Cor do
Rito: Violeta. Mais: o Simões preparou e teve aprovado no Supremo Conclave o
Ritual do Grau 33 que hoje (1999) praticamos. Por isso, a guisa de posfacio, foi feito
um registro histórico.
Esse e o Autor que Você, amigo/Irmão leitor, acabou de apreciar. Cogite o
com cuidado. Procure nas linhas lidas uma reflexão mais profunda. Não e muito
fácil entende-lo de inicio, mas e um deleite encontrar as verdades que revela
Congratulo me com o Leitor, Pelo presente que recebemos.
Para terminar, uma grata missão. O Soberano Grande Primaz do Rito, nosso
Irmão Nei Inocêncio dos Santos, uma figura extraordinária de amor a Ordem,
devoção ao Rito, capacidade de trabalho, muito chegado ao Simões, pediu-me
cumprisse o dever de agradecer e cumprimentar o autor e os editores em nome do
Supremo Conclave do Brasil, o que faço com muita honra e grande alegria. Aceitem
estes elevados cumprimentos, com votos de prosperidade. O escritor: as duras
horas de trabalho, suprimidas do descanso merecido a quem tanto já fez por nossa
Ordem. Obrigado. Os editores, pela confiança no Rito Brasileiro que vai crescendo,
pregando a pluralidade de ritos e pugnando pelo crescimento dos demais ritos e
corpos maçônicos, mas que ainda sofre a incompreensão de alguns círculos, cada
vez mais reduzidos, bem se diga. Estão de parabéns os editores. Sabemos que este
livro vai motivar como disse Palmeira (O Apelo..., op. Cit., idem):
Que se formem, por toda a parte, URBI ET ORBI,
Lojas do Rito Brasileiro, para que a Ordem Renovada possa enfrentar, com
êxito, o fascinante desafio dos tempos Novos.
Por isso, obrigado!
Que a Paz e a Graça de Deus, o Supremo Arquiteto do Universo estejam em
todos os corações.
Fernando de Faria