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quarta-feira, 24 de julho de 2013

POR QUE FOI REIMPLANTADO O RITO BRASILEIRO? (*)


OS SINAIS PREMUMITÓRIOS
DA RENOVAÇÃO MAÇONICA
NO BRASIL E NO MUNDO
 “Inspirada pelo ideal comum, cada Maçonaria nacional guarda na associação internacional sua soberania, seu caráter próprio e suas preferências em matéria de Ritual”.
Proclamação do Congresso Internacional Maçônico de Genebra, de 19 a 28 de outubro de 1921 (vide entrevista do Ir. Mario Behring, em “A Noite”, de 26/06/1922).
 I – O que se prescrevia para a Maçonaria em 1723, há mais de dois séculos e meio, obviamente deve ser reconsiderado para os dias de hoje.
A Ordem Maçônica era àquela época uma instituição apenas fraternista:
“... Deste modo a Maçonaria se converterá em um centro de união e é o meio de se estabelecer relações amistosas entre pessoas – que, fora dela, teriam permanecido separadas – ou não se conheceriam” (“Livro das Constituições”, de Anderson, promulgado pela Grande Loja de Londres, 1723, Old Charges, Cap. I, O que se refere a Deus e à Religião). E
“... sobretudo deve-se evitar discussões sobre religião e política, e sobre nacionalidade” (idem, Cap. VI – da Conduta do Irmão em Loja, 2º).
Em suma: há mais de 250 anos, na Loja se predicava total neutralismo em assuntos políticos, religiosos e de nacionalidade. Essa abstenção, imposta pelas condições próprias da época, conduzia diretamente ao abandono de qualquer interesse cultural ou civil. E os Rituais, desde essa época, para serem disciplinadamente autênticos, teriam de espelhar e difundir como único objetivo da Ordem apenas o solidarismo, e nada mais, traduzido no viver dos Irmãos em boa camaradagem.
Assim tem a Ordem permanecido estática em muitos Orientes, sobretudo no mundo anglo-germânico.
- Hoje, porém, a Loja Maçônica adquire características tridimensionais: além de grêmio de fraternidade, é centro de cultura e escola de civismo.
Há, por isso, que vencer a Rotina e reformular os Rituais, expungindo-se-lhes as omissões e também os erros, incongruências e velharias, acumulados através do tempo.
 II – A Renovação Maçônica foi suscitada no exterior.
Mesmo nos Estados Unidos da América, onde a Maçonaria é arraigada, como na Grã-Bretanha, ao tradicionalismo, houve vozes reclamando a atualização da Ordem. Sentem o cheiro de alfazema em renda velha, mas querem viver o presente. Todavia, não venceram ainda a barreira da rotina.
Vejamos três exemplos promissores:
Em 1921, o Ir. Percy Kelet, Grão-Mestre da Grande Loja de Manitoba, exortava, em termos veementes, o mundo maçônico a sair do imobilismo.
Dizia ele: “O objetivo maçônico não é suscetível de ser atingido somente pelo cumprimento rigoroso das cerimônias do Ritual. Nossa verdade e nossa moral devem encontrar uma aplicação prática nos trabalhos de elevação da sociedade humana. Não podemos desprezar as grandes correntes de pensamento e ação, que demos desprezar as grandes correntes de pensamento e ação, que demos desprezar as grandes correntes de pensamento e ação, que nos rodeiam. Nossa confraternidade tem por obrigação produzir frutos. Se aos olhos da humanidade, a Maçonaria não se afirmar, na realidade, como um poder construtivo, há de ir, fatalmente, caindo no desapreço e no esquecimento, que têm extinto tantas outras instituições. Estamos na véspera do dia em que as instituições como a nossa, ou terão de desempenhar um grande papel, ou desaparecerão”.
Mais recentemente, em um Inquérito realizado entre 1500 maçons da maior evidência,74% responderam afirmativamente à necessidade de uma reformulação da Maçonaria, para que vive (vide “Boletim do Grande Oriente do Brasil, meses de março – maio de 1961, reproduzindo a revista “Die Bruderschaft”, de maio de 1960).
Ainda mais recentemente, o Ir. Doyne Inman, Grão-Mestre da Grande Loja de Wisconsin (EUA) acentuou que:
- “o patriotismo é uma qualificação essencial da Franco-Maçonaria” e esta “o suporte da autoridade legal e dos altos ideais sobre os quais a Nação foi fundada” (na revista “Haponeh-Hahofsch”, órgão oficial da Grande Loja de Israel – novembro de 1967).
Nessa mesma revista o conceito de evolução, sem ferir a ortodoxia, é reconhecido pela Grande Loja de Israel, quando afirma “temos sido duramente reclamados para um aumento de nossas atividades cívicas, numa forma digna para uma Ordem, que tem os objetivos e o futuro da Franco-Maçonaria” (editorial da mesma revista).
- Todavia, é no mundo latino que há muito a necessidade da renovação maçônica é proclamada. Os testemunhos são numerosos, tanto na Europa como na América.
Basta-nos citar na Europa a França. São palavras de Alexandre Chevalier, Grão-Mestre do Grande Oriente de França, em “Centre de Documentation”, janeiro-fevereiro de 1966:
“O Maçom vive com o seu século, constrói para o seu século e se ele não deve perder jamais de vista os Princípios Fundamentais, que são a razão de ser da Ordem, ele sabe contudo que a aplicação desses Princípio à realidade varia com o contexto histórico da época, e que os tempos novos exigem atitudes novas”.
Ainda na França, a Grande Loja Simbólica de França (note-se a Grande Loja), em sua “Declaração de Princípios”, “impõe aos Maçons o dever de ajudar o desenvolvimento progressivo da humanidade, pelo estudo teórico de todos os grandes problemas sociais e morais”.
Na América Latina são numerosas as manifestações em prol da Renovação, mesmo ousadas, como os “Princípios Gerais para a estruturação da Maçonaria Universal”, de 1947, no Uruguai, aprovados por unanimidade pelas 51 Potências Maçônicas presentes, preconizando a intervenção da Ordem da vida pública, sem dependência de qualquer Partido político, porque “é dever da Ordem assegurar a paz, a justiça e a fraternidade entre os homens, sem diferenciação de raça ou nacionalidade”, e a “Proclamação da confederação Interamericana da Maçonaria Simbólica”, do México, 1954, ratificando, com ênfase, a Declaração de Montevidéu.
 III – A Renovação Maçônica No Brasil.
No Brasil, a Renovação Maçônica vem também de longe. De há muito, em vários Orientes, Irmãos nossos salientaram a necessidade da atualização da Ordem, sem prejuízo do resguardo de seus fundamentos essenciais. Isso ocorria, não só no Grande Oriente do Brasil como nas Potências brasileiras fora dele. (Registre-se a magnífica “Declaração de Princípios” do Grande Oriente (independente) do Rio Grande do Sul, de 1945. E entre as Grandes Lojas estaduais, sobretudo a 5ª, a 8ª e a 11ª Mesas-Redondas e agora (1979), a Convenção realizada no Hotel Glória, no Rio de Janeiro.)
É o imperativo na “vocação nacional”.
Efetivamente. Foram exclusivamente as atividades cívicas e de alto significado político-social, desde a Independência em 1822 até hoje (exercidas a deslado dos cânones neutralistas), que deram o brilho, a honra e a grandeza do Grande Oriente do Brasil, com o aplauso da Nação Soberana.
Mesmo antes da Independência, a consciência dos Maçons do Brasil, os conduzia inelutavelmente ao supremo trabalho em prol da Liberdade e da Justiça Social, às custas, muitas vezes, do sacrifício máximo, como Tiradentes e os republicanos de Pernambuco de 1817, o que ocorreu também gloriosamente em outras terras latinas, tanto na Europa como na América.
O Grande Oriente do Brasil sempre inobservou o neutralismo de Anderson: a Independência, a Revolução de 1824, a Abdicação do Imperador, a República de Piratinim, a firmeza do Brasil na Questão Christie, a Questão dos Bispos, a Libertação dos Escravos, a Proclamação da República, a Constituição de 1891, a separação da Igreja e do Estado, a unidade do Direito Processual, a implantação da Justiça do Trabalho, a Assistência Social, o Voto Secreto, o Divórcio... tudo isso (e muito mais) recebeu da ação maçônica um precioso auxílio, por vezes decisório. Ainda: Congressos Maçônicos, Seminários, Mensagens, Manifestos, Inquéritos e Convenções (sobretudo o Inquérito Nacional sobre a conjuntura brasileira de 1963 e a Grande Convenção de 1965) foram veementes manifestações de inconformismo do Grande Oriente do Brasil com o marasmo do tradicionalismo maçônico.
 IV – A Reimplantação do Rito Brasileiro
Permitam-me os Irmãos que, a seguir, faça algumas referências, pedido-lhes escusas, por serem quase todas de natureza pessoal. É que em minha longa vida maçônica fui veículo, muitas vezes, da coercitiva imposição histórica da Renovação.
 1. Em 1953, há mais de 25 anos, no teatro João Caetano, quando da posse pública do Almirante Benjamin Sodré, como Grão-Mestre Geral do Grande Oriente do Brasil, fui o Autor de uma Proclamação Pró-Unificação Maçônica, produzida em nome do Grande Oriente Unido e de seu Grão-Mestre o Ir\ Leonel José Soares, e belamente secundada pelo Ir.'. Euclides de Figueiredo Sampaio, Grão-Mestre da Grande Loja do Rio de Janeiro. Convém lembrar os itens VI e VII da Proclamação:
“VI – a Ordem Maçônica no Brasil, ora dividida e enfraquecida, precisa unir-se, como outrora, para influir, como lhe cabe na solução dos problemas nacionais e humanos da hora presente;”
“VII – a unidade da Ordem no Brasil será saudada como o alvorecer de seu renascimento, fortuna e glória.”
 2. Quando comuniquei, como Grão-Mestre do Grande Oriente Unido, em novembro de 1956, ao Grão-Mestre Geral do Grande Oriente do Brasil (Ir.'. Cyro Werneck de Souza e Silva), que retornávamos ao Lavradio e o Grande Oriente Unido se unificava com a Veneranda Potência, levando-lhe 51 Lojas, dizia em Manifesto:
“Cremos, firmemente, que, em pouco, a Maçonaria, selecionada no recrutamento de seus aprendizes, depurada dos egoístas e fariseus, renovada em seus métodos e objetivos, unida na solidariedade de seus irmãos, vivificada no exemplário de sua Doutrina, há de reconstituir-se no Brasil e no mundo em magnífica força operativa, presente à solução dos problemas da Pátria e da Humanidade, não faltando à sua destinação suprema, nesta época de uma civilização em mudança. Todos fomos lançados na história da vida, e nela devemos intervir”.
 3. Em agosto de 1960, em alocução que foi lida pelo Ir.'. Moacyr Dinamarco, em São Paulo, na posse do Ir.'. Aurélio de Souza, como Grão-Mestre Estadual, alertava:
“A fase crítica, que atravessam o Brasil e o mundo, exige da Maçonaria uma atuação social, externa, de sumo vigor. Não coletivamente, como Instituição, mas individualmente os Obreiros, como células fecundantes no organismo da comunidade.
Jamais nenhuma geração de maçons teve sobre seus ombros responsabilidade maior do que a atual. Temos que manter a Tradição, mas sem prejuízo da Evolução. Temos que rever as nossas obrigações e a nossa atitude, à vista da época espantosa em que vivemos, assinalada pela tremenda contradição contemporânea. De um lado o vertiginoso progresso material: projéteis teleguiados, aviões supersônicos, cérebro eletromecânico, energia atômica; de outro lado, o mais violento desnível econômico e a mais vergonhosa descensão dos valores e virtudes morais, estabelecendo-se por toda parte o primado antimaçônico da matéria sobre o espírito. Temos que intervir, para sobreviver”.
 4. Em agosto de 1961, na renovação do mandato do Ir. Aurélio, em São Paulo, ponderava:
“Assumistes, Em.'. Ir.'. Aurélio, o Supremo Malhete Estadual numa época difícil para a Instituição. Porque a Maçonaria não pode mais permanecer estática e inerme, à margem do grande rio da Vida. Ela há que operar uma reformulação, em sua atividade, mantendo a imanência substantiva de sua doutrina, mas atualizando o que é nela adjetivo e contingente.
Não renovemos a Maçonaria pelo temor, mas não tenhamos termos de a renovar. Se o não fizermos, a Maçonaria será superada pela fase tumultuária deste Ciclo histórico em que vivemos”.
 5. Em junho de 1962, o imperativo da Renovação, que crescia no Brasil, impôs-se com força a vigor entre os Irmãos paranaense. O Ir.'. Otavio Blatter Pinho apresentou ao Congresso de Maringá a tese: “Atualização e Reforma de Base da Maçonaria”, aprovada por unanimidade:
“Que fazer então? Evoluir, conceitualmente, dessa já avelhantada fase especulativa. Em outras palavras: acordar a Maçonaria. Que ela saia dessa posição cômoda e quase inútil de instituição Espéculo-Estática e adquira uma posição Normo-Dinâmica. Essa, sim, a única solução de base para o estiolamento da Ordem. Que deixe ela como fase passada o investigar as cousas como foram e entre no futuro, fixando as cousas como devem ser”.
 6. Em dezembro de 1963, em meio a uma grande crise político-institucional em nossa Pátria, lancei, como Grão-Mestre Geral, na “Mensagem aos Obreiros da Jurisdição”, um rumo e um apelo:
“Só há uma forma de vencer a crise e dominá-la: é a unificação dos esforços, díspares mas sinérgicos, sob a égide do Grande Oriente, restabelecendo-se o indispensável diálogo democrático entre as classes interessadas, proscrito qualquer recurso à força e à subversão.
Mudar, para melhorar, dentro da Lei.
No Brasil, só o Grande Oriente, que é a maior instituição civil do País, com um século e meio de gloriosas tradições, pode ser o homocentro natural da Evolução, posto na vanguarda do momento histórico, confluindo para ele todos quantos desejam um Brasil próspero, liberto e feliz. Já Anderson, em 1723, em Londres, antecipava ser a Maçonaria, “um centro de união”.
Na atual conjuntura, o Grande Oriente exige de seus membros uma fidelidade ativa aos ideais da Instituição”.
7. Em setembro de 1964, no Seminário de Estudos Maçônicos, na 9ª aula, disse aos Irmãos:
“Temos que manter na Maçonaria o que é tradicional e imutável, isto é, aquilo que constitui a parte substantiva e estática: é o resguardo dos valores imperecíveis. Mas não podemos ser misoneistas: conservadores, sim, mesmo ortodoxos, daquilo que configura a essência da instituição. E liberais, amplamente liberais, em sua parte adjetiva e dinâmica, para que a Instituição nunca perca a sua destinação de órgão propulsor do progresso social: nisso estamos fiéis ao espírito da latinidade. Em verdade, a genuína ação maçônica deve transcender os limites do espaço e do tempo e se estender a toda a História.
Maçonaria puramente estática é Maçonaria amputada. Direi melhor: é Maçonaria decapitada. Porque em toda a parte cabe à Maçonaria o papel de dirigir, reger e comandar”.
 8. Em maio de 1967, na 20ª aula do Seminário, concitava, mais uma vez, à renovação da Ordem. Exortei os Irmãos a que deveríamos ver a Maçonaria da mesma altitude em que se colocara o Papa Paulo VI, quando se referiu ao Cristianismo: “... é como uma árvore sempre em primavera, com novas flores e frutos, uma fonte inexaurível de vitalidade e beleza”. E acrescentei:
“O lema do Grande Oriente (Novae Sed Antiquae) impõe se concilie a Tradição com a Evolução. A Tradição diz respeito à Doutrina, enquanto a Evolução constitui a ação da Ordem no seio da comunidade. A Tradição está contida nos landmarques, na Iniciação, no Cerimonial, na Liturgia e nos Símbolos, - o que constitui um depósito intocável. Mas a Maçonaria não pode ser hierática, estática ou paralisada. A Maçonaria apenas contemplativa seria uma superfetação ou uma superfluidade: não caberia normalmente no espírito do século. Ela há de ser também militante e dinâmica”.
 Tudo isso, porém, que foi dito acima, todo o empenho de fazer a Maçonaria o sujeito e não o objeto da História, toda a ânsia de crescer e de subir, toda a porfia em intervir no momento isso só podia caber com autenticidade num Rito que, mantendo a substância veneranda da Doutrina, impusesse a formação da Cultura ao lado da prática do Civismo em suas Lojas de Irmãos, para uma crescente dignificação da vida pública e social, em cada Pátria.
Por isso, em 1968, em março, foi reimplantado o Rito Brasileiro, para servir a esses nobres ideais.

Álvaro Palmeira
Grande Instrutor do Rito Brasileiro

Grão-Mestre Geral Honorário do Grande Oriente do Brasil

SUPERIOR CONSELHO DE CULTURA E ORIENTAÇÃO
Agosto de 1979 E.'. V.'.

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