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quarta-feira, 27 de junho de 2018

KATIPUNAN: MAÇONARIA E A REVOLUÇÃO FILIPINA.

Os pilares filosóficos e progressistas da maçonaria, fizeram com que durante os séculos, esta se aproximasse por demais dos grandes movimentos sociais, que alteraram os rumos da história. Se essa aproximação, por vezes, não acontecia pela instituição em si, acontecia na forma da preparação dos seus atores, oriundos desta ordem.
Em diversos processos de independências, de diferentes países, maçons de diferentes grupos, contribuíram em maior ou menos grau para a realização do processo, da forma mais acertada o possível. Algumas vezes havia disputas entre os irmãos sobre o modo de operação ao qual o processo deveria ocorre (vide o caso brasileiro, na disputa entre os grupos de Bonifácio e de Gonçalves Ledo). Essas contendas entretanto, serviram mais para balizar o caráter plural e progressista da ordem, do que para mostrar uma falha entre seus membros.
É certo que poucas vezes a instituição maçônica sobre se desdobrar de uma maneira tão complexa e articulada, como a que ocorreu na última década do século XIX, nas Filipinas. Na época, esse país se encontrava em um processo de assentamento de uma cultura e identidade nacional, assim como viva sobre ação de diversos grupos reformista que buscavam melhores condições nas relações coloniais com a Espanha, país colonizador das ilhas.
Alguns anos antes, as autoridades espanholas observavam com receio, um movimento iniciado por um jovem, chamado José Protasio Rizal Mercado y Alonso Realonda. Formado em medicina na Espanha, José Rizal trabalhava exaustivamente nas Filipinas, não apenas no exercício de sua profissão de salvar vidas, mas também como um missionário a frente da difícil tarefa de formar uma identidade para o povo Filipino.
Antes da chegada dos espanhóis, as Filipinas nada mais eram do que um aglomerado de mais de 7000 ilhas, divididas em diversos reinos e povos. A união sob uma única bandeira era artificial, criada pelo dominador europeu. Nem mesmo a língua se fazia como um elo comum, pois o espanhol era pouco falado entre os populares, que se utilizavam de diversos dialetos existentes nas diversas ilhas. Dentro do regime colonial não havia o indivíduo “filipino”, apenas o “índio”, cidadão de segunda categoria.
As práticas coloniais eram de constante degradação para com o “índio”. Dentre as leis publicadas nos códigos das ilhas, haviam aquelas que obrigavam ao “índio” a retirar o seu chapéu toda a vez que cruzasse com um espanhol na rua. Da mesma maneira, era terminantemente proibido ao “índio”, se sentar na mesma mesa que um europeu, ainda que seja dentro de sua propriedade. No mais, todos os nomes e sobrenomes precisavam ser escolhidos dentro de uma códex elaborado pelo governador, não sendo de livre escolha do indivíduo.
Rizal procurou criar, através de obras artísticas, comícios, jornais, criação de centros sociais e culturais, o senso de coletividade entre todos as pessoas, de modo a acabar com a ideia de inferioridade então existente. Sob as palavras de Rizal, os populares deixavam de ser “índios” e passavam a ser “filipinos”.
Tal o poder de suas palavras, que em 1892, ao fundar uma associação chamada “A Liga Filipina”, o governador geral das ilhas, ordenou que o mesmo fosse exilado imediatamente. Tal busca de Rizal era reflexo do conhecimento por ele recebido no seio da família maçônica. Sim, Rizal foi maçom, iniciado na Loja La Solidariedad, em Madri, em 1890.
A maçonaria como instituição, chegou as ilhas filipinas em 1856, com a fundação da Loja La Primera Luz Filipina, filiada ao Grande Oriente Lusitano. Com o passar dos anos, novas lojas foram criadas, dentre as principais Balagtas nr 149, Taliba nr 165, Pilar nr 203 e Bagong Buhay nr 291. Essas porém optaram por se filiar ao Grande Oriente Espanhol.
Anos ainda haveriam de se passar, antes que fosse fundado um Grande Oriente nas Filipinas. De qualquer maneira, a escolha pelo Grande Oriente Espanhol ao invés do Lusitano, se devia principalmente à questões tanto do sistema colonial, quanto ao fato de a presença de maçons filipinos na Espanha era comum, inclusive haviam lojas exclusivas de filipinos, sendo as principais as lojas Revolucion, em Barcelona, e La Solidaridad, em Madri.
A expulsão de Rizal ocorreu então no dia 7 de julho de 1892. Naquela mesma noite, alguns homens, entre eles Andres Bonifacio, Valentim Diaz, Teodoro Plata e Ladislao Diwa, se reuniram em uma casa na avenida Claro M Recto, para dar início a uma audaciosa organização, que tinha por objetivo livrar as ilhas do laço colonial. Essa associação recebeu o nome de Kataastaasan Kagalang-galang na Katipunan nang manga Anak nang Bayan, que significava Suprema e Venerável Associação dos Filhos do Povo, mais comumente chamada de Katipunan, que significava simplesmente Associação. Todos os homens reunidos na fundação do Katipunan possuiam uma coisa em comum: todos eram maçons, pertencentes as lojas existentes nas Filipinas, principalmente a Taliba.
Na Espanha, muitos maçons de origem filipina, já haviam sido acusados de tramar contra a coroa, principalmente os pertencentes a Loja Revolução – fato negado a exaustão pelos irmãos desa oficina. De qualquer maneira, o governo desconfiado obrigou o fechamento da loja alguns anos após sua fundação.
Assim, para que os planos pudessem ser elaborados sem o risco de interferência pelo governo, os fundadores optaram por manter a estrutura maçônica oculta dentro do Katipunan, dividindo os associados em 3 graus, que se reuniriam em grupos, subordinados a um órgão chamado Supremo Conselho do Katipunan, ou Kataastaasang Sanggunian.
O ingresso de novos membros ao Katipunan ocorria por indicação de um dos associados. Após sindicância, o iniciado passava por um ritual, baseado nos ritos de iniciação maçônicos. Estando ao final apto, este então recebia o primeiro grau da associação, chamado Katipon. Os associados a esse grau utilizavam um capuz negro nas reuniões, com um triângulo branco que trazia as letras Z. Ll. B.. O Katipunan se utilizava de um alfabeto próprio, criado para impedir que estranhos tivessem acesso aos documentos do Katipunan. Assim, tais letras convertidas para o Alfabeto latino eram iguais a A ng. B, que eram a sigra de Anak ng Bayan, ou Filho do Povo, que era por sua vez a palavra passe desse grau.
Ao ser admitido no segundo grau do Katipunan, o associado recebia o título de Kawal, ou soldado, passando então a utilizar um capuz verde, que trazia um triângulo de linhas brancas, com as letras Z, Ll. B. Em cada um dos vértices. O Kawal também portava uma fita no pescoço, com uma medalha, que trazia encrustado a letra K, no antigo alfabeto tagalog, posto à frente de uma espada cruzada com uma bandeira. A palavra passe desse grau era Gom-Bur-Za, que era uma abreviação para Gomez, Burgos e Zamora, homens que haviam sido executados anos antes pela coroa espanhola, ao lutar nos primeiros movimentos pela independência.
Escrito no oriente do Rio de Janeiro, aos 30 dias do mês de Janeiro do ano de 2011 por Tales de Azevedo
Copilado do site : http://www.artefilipina.com/2011/06/katipunam-maconaria-e-revolucao.html
Sobre o autor: Tales de Azevedo é praticante de Arnis/Kali. Formado em História, é autor do livro Filipinas: História e Artes Marciais, disponível no Clube dos Autores. Esse texto se encontra registrado no SafeCreative sob o código 1106029357091. Você pode distribuir esse texto livremente, desde que os créditos sejam mantidos e exista um link para esta página.


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